Vasco da Gama, o time que venceu o racismo

Se o Vasco não foi o primeiro clube brasileiro a contar com jogadores negros em seu elenco, alguns pesquisadores defendem que a primazia foi do Bangu, outros que a Ponte Preta foi a pioneira, não há dúvida que o Club de Regatas Vasco da Gama adotou uma atitude que contribuiu decisivamente para a inclusão de atletas negros, mulatos e demais brasileiros que não pertenciam à elite.

“Ao Vasco foi negado o acesso a AMEA, sob a falsa alegação do clube não ter estádio próprio, poré, o real motivo da negativa veio a tona quando foi apresentada uma proposta indecorosa, na qual o Vasco da Gama seria admitido na referida associação desde que eliminasse do time os 12 jogadores negros, pardos, caixeiros e operários.”

Em 1923, uma equipe considerada pequena, que acabara de ser promovida a primeira divisão, conquistou o campeonato carioca. Como se isso não bastasse para provocar a ira dos aristocráticos clubes grandes, o campeão era formado por trabalhadores de origem humilde, brancos, negros e mulatos, sem dinheiro nem posição social. Este campeão era o Vasco da Gama.

Naquela época, o racismo imperava no futebol brasileiro. Em 1921, era debatido se jogadores de cor deveriam ser convocados para os importantíssimos confrontos entre a seleção brasileira e a da Argentina.

Como vingar-se do atrevimento do Vasco? Os clubes aristocratas reuniram-se e deliberaram excluir jogadores humildes, sob a alegação de que praticavam o profissionalismo. Numa sessão realizada na sede da Liga Metropolitana, Mário Polo, o presidente do Fluminense, apresentou as condições impostas aos chamados pequenos clubes.

Estes teriam que apresentar condições materiais e técnicas e eliminar de seus quadros sociais jogadores considerados profissionais, constantes de uma lista que foi lida no momento.A confusão e as vaias explodiram no recinto ao término da exposição feita por Mário Polo.

Finalmente usou da palavra Barbosa Junior, do S.C. Mackenzie, representante dos chamados pequenos clubes, condenando o racismo dos grandes clubes, uma vez que os jogadores atingidos eram apenas os mulatinhos rosados do Vasco, Bangu, Andaraí e São Cristóvão, sendo o Vasco o mais prejudicado de todos.

Os arianos do Fluminense, Botafogo, Flamengo e América nem de leve foram tocados. Os aplausos calorosos da enorme assistência a Barbosa Junior deixaram a Mário Polo desapontado.

A confusão foi de tal ordem que a sessão foi suspensa por dez minutos, durante os quais Mário Polo e Ari Franco, o representante do Bangu, retiraram-se juntos para uma das salas onde conversaram secretamente.

Vendo seus planos irem por água abaixo, os clubes grandes decidiram que se afastariam da Liga Metropolitana, formando uma nova entidade, a Associação Metropolitana de Esportes Atléticos. Estava decretada a cisão do futebol carioca. Mário Polo e seus comparsas calculavam que os chamados pequenos clubes ingressariam cabisbaixos e humilhados na nova entidade, submetendo-se às suas regras discriminatórias.

Bangu e São Cristóvão, que possuíam jogadores atingidos pelo racismo, confirmaram as expectativas dos grandes. Os demais fatalmente seguiriam essa opção, não fora a atitude desassombrada do presidente vascaíno Dr. José Augusto Prestes e da diretoria do Vasco, enfrentando com galhardia a campanha racista, apoiado pelos outros pequenos clubes.

Um ofício assinado pelo presidente do Vasco foi enviado a Arnaldo Guinle, presidente da AMEA, declarando publicamente que negava-se a participar da nova entidade. Esse documento histórico, transcrito abaixo, deu origem a extinção do racismo no futebol.

Com a inauguração do estádio de São Januário, em 1927, o Vasco, que em 1924 era o menor dos grandes, transformou-se no maior entre todos os clubes do Brasil.


Fonte: http://observatorioracialfutebol.com.br Atualizado em: 19/10/2017 14h50